sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Negócios e embaraços franceses

Por muito que Nicolas Sarkozy desminta a existência de contratos de venda de armas da França à Líbia como contrapartida para a libertação das enfermeiras búlgaras e do médico palestiniano, já não se livra de algum embaraço.

Pelo menos a oposição socialista ao seu governo não parou de protestar nos últimos dias por ter tido conhecimento através dos líbios da conclusão ou preparação dos contratos, os primeiros desde o fim do embaro internacional de venda de armas à Líbia em 2004. Os socialistas exigem explicações sobre o que consideram uma “questão de estado”, para averiguar se não se tratará de uma “mentira de estado”.

Tudo começou com as declarações ao jornal Le Monde de Saif Al-Islam Kadhafi, o filho do coronel Kadhafi (que teve um papel central no processo de libertação das enfermeiras e do médico, nomeadamente com a negociação das indemnizações pagas às familias das crianças infectadas com o virus da SIDA), sobre as contrapartidas que teriam sido obtidas por Tripoli para extraditar os acusados para Sófia, no dia 24 de Julho. Segundo afirmou, uma das contrapartidas consistiu num contrato de venda de misseis anti-tanque Milan, no valor de cerca de 100 milhões de euros.

Desde então, a existência de dois contratos foi confirmada por várias fontes oficiais líbias a vários orgãos de informação em Tripoli. Segundo estas fontes, o contrato dos mísseis Milan, num valor de 168 milhões de euros, foi concluido com a empresa MBDA (o fabricante, nomeadamente, dos misseis Exocet). O segundo contrato, concluído com a EADS, incide sobre o fornecimento de um sistema de comunicação radio Tetra, no valor de 128 milhões de euros.

A última reacção do porta-voz de Sarkozy, David Martinon, fala por si. “Imagino que é verdade”, mas “não confirmo”, afirmou quinta-feira à noite à imprensa francesa. “O meu papel não é comentar transacções comerciais”, precisou. E repetiu o que já tinha dito na véspera: nenhum contrato foi assinado durante a visita de Sarkozy a Tripoli, no dia imediatamente a segiur à libertação das enfermeiras e do médico. Isto, precisando que a visita de Sarkozy se fez “para o maior benefício dos industriais franceses, acelerou muito as coisas”.

Por agora, os países da UE mantém-se silenciosos sobre esta súbita amizade com um país que ainda há pouco era classificado como terorista, com excepção do ministro belga dos negócios estrangeiros (ver o post precedente). Ou da Alemanha que, quando o único contrato conhecido entre a França e a Líbia incidia sobre o fornecimento de um reactor nuclear para a dessalinização da água do mar, considerou o negócio lesivo dos interesses comerciais alemães.

Não é de supôr que o folhetim esteja para acabar. Mas o Eurotalk vai de férias, embora se mantenha firmemente decidido a acompanhar a actualidade. Voltaremos a este e muitos outros assuntos a partir de Setembro. Boas férias a todos.