sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Desunião Europeia

É um daqueles paradoxos difíceis de perceber: a França, presidente em exercício da UE, é o país que mais apelos tem feito à unidade dos Vinte e Sete na reacção à crise financeira. Mas é, igualmente, o país que decidiu convocar uma minicimeira limitada aos quatro maiores Estados da UE (França, Alemanha, Reino Unido e Itália).

O pretexto é que estes são os quatro países europeus do G8, e precisam, assim, de concertar posições para as próximas reuniões desta instância. Certo. Mas bem antes de qualquer cimeira do G8, haverá uma cimeira dos Vinte e Sete, a 15 e 16 de Outubro. O que transforma a minicimeira de amanhã, em Paris, na preparação a quatro da discussão dos Vinte e Sete. Porquê só quatro?

Como que a dar uma “caução europeia” à coisa, Paris convocou também os presidentes do Eurogrupo dos ministros das finanças dos países da moeda única, do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia, ou seja, Jean-Claude Juncker, Jean-Claude Trichet e Durão Barroso, respectivamente.

Mas, depois de ter convocado uma cimeira de urgência dos Vinte e Sete para a tomada de uma posição comum sobre a Geórgia (no dia 1 de Setembro), porque é que o presidente francês, Nicolas Sarkozy, não fez o mesmo sobre a crise financeira?

Tal como citei no Público de hoje, a iniciativa sarkozyana incomoda os países excluídos, que encaram invariavelmente os encontros em pequeno comité como o “directório" dos grandes em acção. Oficialmente, só a Espanha protestou, embora suavemente, apontando para a contradição francesa dos apelos à unidade europeia misturados com encontros limitados aos grandes.

Os outros, provavelmente para não deitar mais achas para a fogueira da volatilidade dos mercados, ficaram calados. Mas não deixaram de criticar, em privado, a exclusão de 23 países, a par do facto de a minicimeira ter sido anunciada no site da presidência francesa da UE – que deveria, em teoria, ser consagrado às actividades a Vinte e Sete - e acima de tudo, o facto de a cimeira se centrar num problema que interessa e afecta todos os países, sejam eles membros do G8 ou não.

Hans-Gert Poettering, presidente do Parlamento Europeu, tentou sossegar as críticas, frisando que a minicimeira não pode tomar decisões, mas apenas fazer propostas. Os quatro países “não poderão decidir pelo conjunto da UE”, as decisões terão de ser tomadas pelos “Vinte e Sete” e pelas “instituições comunitárias”.

Mas, como referiu um diplomata que citei igualmente hoje, “se uma reunião com o peso dos quatro grandes da UE e dos presidentes de três importantes instituições comunitárias tiver resultados, os outros países terão grandes dificuldades em ter uma opinião diferente”.

Parece-me óbvio.

1 comentário:

Anónimo disse...

Cara Isabel,

Não acha que os presidentes do Eurogrupo e da Comissão deviam ter recusado participar e disso terem feito alarde para não caucionarem esta falta de espírito de grupo?

Posto isto, a mini-cimeira do directório europeu de pouco ou nada serviu. Ironia dos nossos tempos: os grandes já não são tão grandes assim, antes precisam dos pequenos e médios.

Saudações,

Alexandra