quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Contos de fadas...

É curioso como ainda há quem acredite em contos de fadas. Ou, mais concretamente, que a criação de um presidente permanente do Conselho Europeu teve o objectivo de dar coerência à acção da UE e reforçar o seu peso e voz no Mundo. Uma espécie de "George Washington europeu".

Para que se saiba, a ideia partiu do Reino Unido - mais exactamente de Tony Blair, na altura primeiro ministro (será que em 2002 já estava a pensar que poderia ser o escolhido?). A convicção britânica foi de imediato assumida por Giscard d'Estaing que presidia na altura à Convenção encarregue de redigir o primeiro projecto de Constituição Europeia. E que concebeu o posto à sua medida, convicto como estava de que poderia ser o escolhido se a Constituição tivesse entrado em vigor, como era previsto, no início de 2006.

Os proponentes tinham em comum a mesma determinação de evitar que a UE fosse presidida por micro Estados - Malta, Chipre, os Bálticos ... - por via do sistema das presidências semestrais rotativas entre todos os países. O argumento de ambos assentava na necessidade de assegurar a continuidade do trabalho do Conselho Europeu, reforçar a sua eficácia e dar alguma coerência à representação externa da UE.

Os ingleses tinham uma motivação adicional bem mais problemática: desequilibrar, por via do presidente permanente do Conselho Europeu, a arquitectura institucional da UE de maneira a reforçar o peso do Conselho de Ministros e fragilizar a Comissão Europeia.

escrevi neste blog, e volto a repetir o que um dia Jack Straw, ex-MNE de Blair, disse em Bruxelas, à minha frente, a propósito deste cargo: "O Reino Unido foi sempre um grande defensor do presidente do Conselho Europeu para proteger os Estados membros contra o poder da Comissão Europeia".

Aliás, se os franceses e os britânicos tivessem um mínimo de seriedade sobre os argumentos da continuidade, eficácia e coerência, teriam dado ao presidente da Comissão Europeia - actualmente Durão Barroso - a responsabilidade de presidir ao Conselho Europeu. De facto,

- ninguém conhece como ele as propostas legislativas em discussão (é a sua instituição que as propõe)

- ninguém tem um conhecimento tão aprofundado como ele das diferentes sensibilidades em jogo (porque a sua instituição acompanha a par e passo as negociações entre os Vinte e Sete e propõe os compromissos)


- ninguém representa a UE no exterior tão bem como ele: Durão Barroso talvez não faça "parar o trânsito" em Washington ou Pequim, como dizem os defensores de Tony Blair, mas é conhecido, ouvido e respeitado em todo o Mundo

Há quem alegue que esta solução seria impossível porque o presidente da Comissão não pode fazer as propostas legislativas e simultaneamente presidir ao orgão que as aprova.

Será? Mas não é isso mesmo que fará o Alto Representante para a Política Externa ? E se o vice-presidente da Comissão Europeia o pode fazer, porque não o Presidente da mesma Comissão?





1 comentário:

HY disse...

Parabéns, Isabel, por não se ter deixado ir na cantiga do vigário. Claro que a ideia não era o de nomear para Presidente do Conselho Europeu o Georges Washington da Europa. Essa podia ser a ideia original do Giscard, mas o que saiu no TL (tal como na Constituição) não foi isso que ficou consagrado. Porque as ideias de VGE, do RU e provavelmente dos outros grandes Estados-membros, foram contrariadas por outros, como JLDehaene, a delegação do PE à Convenção, a maioria dos pequenos e médios Estados membros e a própria Comissão. E o compromisso final foi um presidente do Conselho EUropeu, que deve assegurar coerência da acção deste e promover o consenso entre os Estados membros, mas não o líder político da Europa.

Pese à sua colega Teresa de Sousa, que tanto gostaria de ver uma certa grandíssima personalidade representar a Europa no plano internacional, não é ao Presidente do Conselho Europeu, mas sim ao Alto-Representante, que cabe dirigir a política externa da UE... o Presidente do Conselho Europeu só terá funcções de representação externa da UE a nível protocolar, como é típico dos chefes de Estado dos sistemas parlamentares... e é esse o modelo que a EU re-afirmou pretender seguir no tratado de Lisboa, não o meodelo presidencial à maneira americana...