Hoje é um grande dia para a Europa: a partir de Julho, vamos passar a poder consumir pepinos curvos, cenouras tortas, ou maçãs com bossas. Acabou-se a obrigação de calibragem dos frutos e legumes, o que permitirá a novos produtos de todas as formas e feitios regressar às prateleiras dos supermercados, mercearias, e por aí fora. É suposto os consumidores ganharem com a operação, através do acesso a produtos de menor valor comercial, logo mais baratos, que actualmente vão para a transformação ou para o lixo.
Com esta decisão, chega ao fim um dos maiores e mais arreigados mitos da história da UE, segundo o qual as normas de calibragem foram inventadas pela fúria reguladora dos burocratas de Bruxelas. Nada mais falso. A calibragem, como muitas outras decisões de harmonização das normas nacionais, foi decidida por exigência dos Estados membros como contrapartida para a abertura dos seus mercados à livre circulação de produtos no espaço comunitário.
Antes da criação do mercado interno sem fronteiras, cada país da UE tinha as suas próprias regras de comercialização para todos os produtos imagináveis, que funcionavam, muitas vezes, como barreiras proteccionistas contra a concorrência dos países vizinhos.
Para convencer os Estados a abrir as fronteiras, o compromisso encontrado foi uma harmonização mínima das regras ao nível europeu. O que resultou nas actuais normas comunitárias, que impõem determinadas características em termos de cor ou dimensão aos produtos comercializados no mercado interno.
Curiosamente, este reflexo proteccionista repete-se agora face à concorrência dos países terceiros. José Burnay, presidente da Federação Nacional de Produtores de Fruta e Hortícolas manifestou-se contra a medida (em declarações à Lusa) afirmando que sem a calibragem o mercado nacional será “invadido por produtos de menor qualidade provenientes de países que produzem em contra estação, nomeadamente de países do hemisfério sul”.
Luis Mira, secretário-geral da CAP (Confederação dos agricultores de Portugal) disse praticamente a mesma coisa (igualmente em declarações à Lusa): a medida “vai prejudicar os consumidores porque vai permitir a entrada de produtos de outros países que não da União Europeia que não estão normalizados”. Também prejudica a vida aos produtores e consumidores porque deixam de ter "pontos de referência que permitam comparar preços”.
Não foi por acaso, aliás, que a decisão da Comissão contou com os votos negativos de dezasseis países e a aprovação de apenas nove. Dois, incluindo Portugal, abstiveram-se. (Os votos negativos não foram suficientes para atingir a maioria qualificada que seria necessária para rejeitar a proposta).
1 comentário:
O curioso nisto tudo é que afinal o mito não era mito...
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