E se Durão Barroso fosse politicamente confirmado para um novo mandato de cinco anos já durante a cimeira de líderes da União Europeia (UE) de 11 e 12 de Dezembro?
Este calendário, que representaria uma antecipação de seis meses do processo de nomeação do presidente da Comissão Europeia, tem vários adeptos nos meios comunitários, a começar pela actual presidência francesa da UE.
Nicolas Sarkozy, Presidente francês, nunca escondeu que gostaria de liderar durante a sua presidência europeia o processo de nomeação dos cargos que, à luz do Tratado de Lisboa, deveriam ser preenchidos até Junho de 2009, com base num "pacote" assegurando um certo equilíbrio entre famílias políticas e nacionalidades.
Esta pretensão, que não desapareceu com o previsível adiamento da entrada em vigor do Tratado, vai fazendo o seu caminho.
O grande argumento a favor de uma confirmação rápida de Barroso tem a ver com a necessidade de evitar uma perda de influência da UE durante a primeira metade de 2009, em contraste com a forte liderança exercida pela presidência francesa ao longo deste semestre. Nessa altura, a Comissão, o Parlamento Europeu (PE) e o alto-representante para a Política Externa estarão em fim de mandato, com uma capacidade de acção inevitavelmente reduzida. Ao mesmo tempo, a UE será presidida pela República Checa, cuja falta de experiência, imprevisibilidade e eurocepticismo começam verdadeiramente a assustar as outras capitais.
A ideia de confirmar Barroso já em Dezembro destinar-se-ia precisamente a garantir que pelo menos uma instituição estaria a funcionar em pleno graças à perspectiva de continuidade, podendo, ao mesmo tempo, "enquadrar a presidência checa e falar em nome da UE de uma forma um pouco mais credível", segundo um diplomata europeu.
Legalmente, o presidente da Comissão só pode ser escolhido pelos líderes dos Vinte e Sete - e confirmado pelo PE - depois das eleições europeias de Junho de 2009 e em função dos seus resultados. Mesmo assim, nada impede Sarkozy de expressar oralmente o apoio político dos Vinte e Sete à continuidade de Barroso, embora salvaguardando que a decisão formal só será tomada pela cimeira prevista logo a seguir às eleições. Este cenário corre sempre o risco de ser rejeitado pelo PE por representar uma inversão do processo.
"Não há soluções perfeitas", reconhece Antonio Missiroli, director do European Policy Centre, um influente think tank europeu, considerando no entanto que a confirmação rápida de Barroso seria a "menos má". Sem isso, refere, "a sua conduta na primeira metade de 2009 corre o risco de ser interpretada à luz da sua ambição pessoal". Ao mesmo tempo, se a decisão for adiada para Junho, "a sua nomeação corre o risco de ocorrer num contexto pós-eleitoral muito negativo e antieuropeu", o que será "terrível" para a instituição e o seu presidente. Podendo mesmo custar-lhe o lugar, se os responsáveis europeus chegarem à conclusão de que será necessária uma renovação.
Apesar de a possibilidade de uma decisão em Dezembro não estar confirmada, e poder mesmo nunca se concretizar, vários sinais parecem apontar nesse sentido.
O mais importante foi dado pelos líderes do PPE, a federação dos partidos conservadores (maioritária na UE e que integra o PSD português) durante a reunião realizada a 15 de Outubro imediatamente antes da cimeira dos Vinte e Sete: por iniciativa - algo inesperada - de Jean-Claude Juncker, primeiro-ministro do Luxemburgo, os líderes presentes expressaram um apoio de princípio à continuação de Barroso, embora adiando para a cimeira do PPE de Dezembro (que antecederá de novo a dos Vinte e Sete) uma decisão formal na matéria. Esta decisão resulta da convicção de que os partidos membros do PPE ganharão uma vez mais as eleições, podendo, como em 2004, voltar a escolher o presidente da Comissão nas duas fileiras. E, mesmo se o actual titular não suscita um entusiasmo de maior, o próprio PPE sabe que não tem por agora grandes alternativas.
Uma das grandes incógnitas que pesam sobre o cenário de Dezembro, tem a ver com Angela Merkel, chanceler alemã que apreciou pouco ter sido apanhada de surpresa com a questão da presidência da Comissão em Outubro. Merkel não estará particularmente satisfeita com o que é visto em Berlim como uma "colagem" excessiva de Barroso ao Presidente francês na gestão da crise económica e financeira. Sobretudo quando o sem número de iniciativas assumidas por Sarkozy, sem a habitual concertação prévia com a principal aliada, tem colocado regularmente a chanceler em dificuldades.
Já o apoio dos líderes socialistas não parece suscitar grandes dificuldades, quer por estarem conscientes de que não serão a força mais votada em Junho mas, também, porque não conseguem por agora pôr-se de acordo sobre uma candidatura alternativa. Pelo menos três chefes de governo socialistas já exprimiram aliás um apoio sonoro espontâneo à continuação de Barroso - além de José Sócrates, o finlandês Matti Vanhanen, e o espanhol José Luis Rodríguez Zapatero.
Há quem pense mesmo que os socialistas se associarão sem dificuldades de maior à continuação de Barroso se obtiverem como contrapartida o cargo de alto-representante para a Política Externa para um dos seus.
PS 1 - Este texto foi hoje publicado no PÚBLICO, mas reproduzo-o aqui para o caso de não estar disponível na edição online do jornal.
PS 2 - Por lapso, não saiu na notícia em causa quais são os governos liderados pelo PPE, o que é uma lacuna imperdoável que prejudica a compreensão do artigo (e para a qual pelo desculpa). Os países da UE governados por primeiros ministros do PPE são: França, Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Polónia, Malta e Roménia.
2 comentários:
É estranho que não haja mais candidatos. Em plena crise causada pela falta de regulação dos mercados (em que a Comissão – Barroso e Comissário McCreevy – têem grandes responsabilidades) os partidos podem apresentar candidatos anti-Barroso e colar a imagem de Barroso aos outros partidos que apoiam a sua recandidatura. Parece-me que seria uma muito boa estrategia para ganhar votos numa altura em que os votos serão sobretudo motivados pela contestação (não me parece que vá haver grande debate de ideias, infelizmente...)
Inteiramente de acordo.
Não há candidatos porque os lideres dos grandes países da UE, por definição, preferem um presidente da Comissão o mais fraco possível e que lhes faça a menor sombra possível. Nesse contexto, Barroso será a melhor escolha. Mas um segundo mandato ainda não está garantido, longe disso. Ao contrário do que se tem dito, Angela Merkel nunca manifestou publicamente o seu apoio à continuação de Barroso, o que pode querer dizer muita coisa...
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